
Crónicas de campo #5
Os matos mediterrânicos, comuns de encontrar em Portugal continental, são um testemunho vivo da evolução natural das condições ecológicas a par com a ocupação humana que moldou e alterou a paisagem até aos dias de hoje.
Viajando no tempo é possível verificar que a distinção das estações há mais de dois milénios com o verão marcado pelo estio foi determinante para o surgimento de novas espécies, mais adaptadas a estas condições. Aliado ao aquecimento progressivo do planeta e mais acentuado nos atuais países mediterrânicos, a introdução do fogo pelo ser humano na paisagem de forma regular acelerou e favoreceu todo o processo; fosse para a abertura de clareiras para domesticação e criação de animais, ou para a prática dos primórdios da agricultura selvagem e itinerante. Áreas arborizadas, húmidas e densas foram progressivamente tornando-se mais abertas e novas espécies surgiram aptas às novas condições de temperaturas elevadas, solos mais pobres e fogo frequente: os ditos matos que também podem ser distintos em matos altos/maquis e matos baixos/garrigues.
Nesta crónica iremos focarmo-nos nos matos baixos, essencialmente espécies arbustivas de pequeno porte, até um metro de altura, que tendem a crescer em clareiras e/ou orlas de forma extensa e por vezes homogénea com a predominância de uma ou duas espécies. Estas espécies tendem a regenerar após o fogo por semente, ao contrários das espécies dos matos altos que é mais comum regenerarem com novos rebentos pela raiz ou pela toiça principal queimada.
O seu aspecto rústico é revelador das suas estratégias de sobrevivência à seca e temperaturas elevadas, seja pelas folhas coriáceas de textura áspera, geralmente pequenas, por vezes reduzidas a acúleos/espinhos, com pelos ou com óleos essências. Inúmeras combinações possíveis destas características que têm como finalidade primeira diminuir a evapotranspiração das plantas, isto é, perdas de água quando expostas ao calor.
Falar destes matos é falar da maior parte das aromáticas na europa, como os tomilhos, rosmaninhos, orégãos, sálvias ou estevas. Arbustos que na primavera se enchem de cor com florações densas, aromáticas e exuberantes entre tons de amarelo, branco e roxo e, fazem as delícias de polinizadores como as abelhas, borboletas e escaravelhos-das-flores que atarefados aqui encontram uma abundante fonte de alimento sazonal.
Estevinha em flor Rosmaninho em flor
No verão os matos estarão carregados de frutos com numerosas sementes quando as temperaturas estão mais elevadas e propícias aos fogos por causa natural ou, mais frequentemente de origem antrópica.
Estes matos são também importantes refúgios para fauna de pequeno porte como cobras, coelhos e passeriformes que procuram abrigo entre as ramagens densas e rasteiras, eficazes para os proteger de predadores como as águias que ao planarem sobre os matos não detectam facilmente as presas ocultas.
No Parque Natural de Sintra-Cascais, podemos ver estes matos na área da Estrada da Serra que apresenta condições francamente mediterrânicas. Os trabalhos na área, nomeadamente com a remoção progressiva da vegetação exótica invasora tem permitido abrir espaço e criar condições para que o garrigue expanda. Findos cinco anos de continuas intervenções, é notória a densidade e diversidade de espécies a regenerar e, o impacto positivo das mesmas em sustentar o crescimento das espécies arbóreo-arbustivas plantadas criando ensombramento e estrutura no solo para melhor desenvolvimento das raízes, assim como para atracção de diversidade de polinizadores.
