As florestas de crescimento antigo são um património natural que encerra milénios de uma beleza natural incólume, transformando-se em relíquias de uma natureza perdida. Em Portugal, mas também na Europa, são de tal raridade e preciosidade que nos remetem para um mundo natural ancestral. Entrar nelas, é uma experiência imersiva. Protegê-las, é o nosso destino.
A paisagem natural que hoje conhecemos na Europa, que recorrentemente assumimos como original, está longe da realidade. A verdade é que o velho continente Europeu tem perdido os seus tesouros naturais mais antigos. Na Europa, se excetuarmos a Rússia, apenas cerca de 2% das florestas são primárias, pristinas, originais, contendo uma biodiversidade impressionante, que outrora preencheu vastos ecossistemas de floresta que cobriam grande parte do continente.
A maior parte destas florestas relíquia encontra-se protegida, mas à medida que a pressão humana continua a aumentar, o futuro destas florestas não está garantido.
A Plantar Uma Árvore – Associação tem tido alguma intervenção neste domínio, em concreto na Mata Nacional do Bussaco, na Floresta Laurissilva da Madeira e dos Açores e no Parque Natural de Sintra-Cascais, neste último caso, com algumas deceções pelo caminho.
A intervenção mais concreta na salvaguarda destas florestas relíquia, tem sido, indubitavelmente, no contexto da Mata Nacional do Bussaco (MNB), onde, atualmente, temos uma equipa a trabalhar de forma permanente e contínua.
Embora muito focada na reconversão da área do Pinhal do Marquês, com a remoção das invasoras e plantação de espécies autóctones, são empreendidas ações de salvaguarda do arboreto e do adernal, focadas no controlo de invasoras, permitindo evitar a degradação que resultaria de tal competição.
Aqui encontramos uma formação vegetal clímax de plantas autóctones, como o carvalho-alvarinho, o carvalho-negral e o loureiro, com a presença do medronheiro, do folhado, do azevinho, da gilbardeira, mas destaca-se o adernal, com o aderno-de-folhas-largas, que aqui atinge um porte arbóreo dominante, sendo que, segundo alguns autores, conserva as características típicas da floresta primitiva, antes da perturbação humana, ocupando, infelizmente, apenas uma pequena fração da MNB.
A intervenção na Floresta Laurissilva da Madeira e dos Açores foi mais pontual, acima de tudo com campos de voluntariado jovem internacionais e iniciativas de envolvimento da comunidade local, muito baseadas no restauro ecológico, com foco no controlo de espécies invasoras, procurando-se ativamente, sensibilizar a comunidade local, turistas e em particular os jovens locais, para a beleza, valor e importância de tal património, como se pode ler no artigo dedicado aos campos de voluntariado.
É nestas regiões insulares onde encontramos as grandes manchas de florestas antigas, de Portugal. Nos Açores, representam manchas mais restritas, mas, na Madeira, representam áreas ainda bastante significativas, correspondendo a cerca de 20% da superfície da ilha da Madeira.
A Floresta Laurissilva é uma floresta relíquia, por si só, já que incorpora comunidades de vegetação que durante o Cenozóico se estendiam numa extensa faixa do Sul da Europa, que quase se extinguiu devido às mudanças climáticas associadas às glaciações ocorridas no Quaternário, persistindo na Madeira, Açores e Canárias, que, juntamente com Cabo Verde, formam a região biogeográfica da Macaronésia, pelo que, entrar nestas florestas nebulosas, é, literalmente, entrar num mundo ancestral.
No Parque Natural de Sintra-Cascais (PNSC), sempre se soube que a paisagem foi fortemente alterada, pensando-se que o Bosque dos Capuchos, a par do que aconteceu na MNB, tivesse sido preservado pelos frades que ali habitavam, todavia, análises realizadas a cinzas encontradas na Anta do Monge, cuja construção remonta ao Calcolítico, tendo sido mantida a sua utilização durante a Idade do Bronze, demonstram a predominância do carvalhal, sem que se tenham encontrado vestígios de sobreiro, a espécie dominante no Bosque dos Capuchos, porventura tendo o sobreiro sido plantado, já que a sua cortiça era abundantemente usada no isolamento hídrico e térmico do edificado.
Embora trabalhemos focados no restauro ecológico e na restituição de bosques nativos, há a perfeita consciência que, mais importante do que criar jovens bosques nativos, é preservar os antigos bosques nativos, relíquias que, por si só, podem ajudar-nos a restituir os habitats e ecossistemas originais.